segunda-feira, 31 de março de 2008

Com mais problemas é difícil ver o lado bom

Eu gostaria de começar este texto dizendo coisas boas. Eu gostaria de começar este texto anunciando somente momentos felizes e boas projeções para o futuro. Infelizmente, uso o tempo verbal correto, a diferença entre o que se deseja e o que se tem é enorme. Quisera eu atenuar os conflitos que me assolam e dizer ao mundo que sou um homem sereno. Porém a serenidade atualmente passa longe de mim, muito longe neste período obscuro em que cada vez mais me consumo. Queria acreditar em melhores dias, mas na atual conjuntura dos fatos, é difícil de acreditar que algo irá mudar.
Não digo essas coisas sem nenhum motivo, pelo contrário, motivos são o que não faltam para resumir a ópera da minha incauta vida de amarguras e decepções constantes. Não gosto de me parecer com um coitado, nem tenho pretensão de sê-lo. Acontece que a imensidade de contrapontos aumentou tanto, que cheguei ao ponto de perder a credulidade nos bons dias. Parece que tudo nessa semana foi impulsionado pela angústia e mágoa. Nunca imaginei que pudesse ter dias tão ásperos como esses. Tanto sofrimento sem sentido que, sem exagero no termo, pensei em morrer, a fim de calar de vez as vozes que me atormentam tanto o corpo como a alma cansada.
Meus problemas se iniciaram há pouco tempo, primeiro com a quebra inexplicável do carro, tão misteriosa que, já passado um mês de caminhada, ainda não foi descoberto o que ocasionou a quebra. Em seguida minha câmera digital resolve fazer queda livre e não resistiu à aterrissagem forçada a que se submeteu. Quando pensava que não teria mais gastos inusitados com consertos dos meus bens, foi a vez do telefone celular me deixar em branco, queimando totalmente a pequena tela de LCD. Dos males, esse foi o menor, pois consegui trocar o aparelho por um novo e com alguns recursos a mais, o problema disso é que mudei de operadora de serviços de telefonia móvel e, assim, perdi toda a minha agenda telefônica e alguns outros dados que estavam salvos no aparelho antigo. Paciência, telefones podem ser anotados novamente e, quanto aos dados, se eu conseguir conectar o telefone ao computador, salvo todos neste. O problema é que há um ano venho inutilmente tentando fazer a transferência dos arquivos sem nenhum sucesso.
Seguindo a máxima de que tudo de ruim tende a piorar, mais acontecimentos infelizes adentraram em minha vida sem ao menos pedir licença ou se apresentar. A maldita obra no banheiro parece não ter valido de nada, pois o vazamento no vizinho continua. Foram vinte dias de estresse com o pedreiro quebrando o chão, reclamando de tudo e me enchendo a paciência para não resolver absolutamente nada. Para agravar de vez a situação, não agüentei mais as reclamações grosseiras do senhor que mora abaixo de minha casa e discutimos de forma exagerada e quase violenta. Tenho certeza de que não perdi um pouco da razão apenas pelo problema atual, muito se deve ao passado de amargura que travamos como inimigos. Pelo que me lembro, desde a infância o convívio com o pai de meu pai foi praticamente impossível. Por isso meus pais saíram daquela casa antes que as interferências mesquinhas e perturbações de toda ordem minasse de uma vez com o casamento deles. Quando retornei a Angra e resolvi juntar minhas tralhas na casa da minha infância, fui avisado que teria aborrecimentos demais para minha parca paciência. Não sou um homem ignorante, muito pelo contrário, sou gentil e educado, abaixo a cabeça para não cair em brigas, engulo meu orgulho para não me indispor com ninguém, mas sou humano, por isso, às vezes, não consigo controlar o que me fere e bole por dentro, às vezes perco a calma e estouro com tamanha intensidade que realmente assusta. Assim o que parecia ser mais um monólogo exaltado do velho tornou-se uma troca de desaforos, em que se disse mais do que deveria. Eu errei em ter caído nas artimanhas do homem vil. Não deveria ter dado ouvidos as suas imbecilidades de homem louco, mas dei e, portanto, tenho que pagar pelo meu descontrole.
Preciso, agora, encontrar um novo lugar para morar, haja vista que continuar na antiga casa da família é inviável e inadmissível. Não só por esse episódio extremamente lamentável, mas devido a uma série de fatores já ocorridos entre nós, tomei a drástica decisão de cortá-los definitivamente do meu círculo social, fraterno e familiar. Que me desculpe meu pai, mas de agora em diante toda a sua família está morta em meu coração. Quando os encontrar por obra do acaso, faço questão de virar o rosto quando passarem por mim, atravessar a rua para não ser obrigado a topar com eles, não um, nem dois, mas todos eles. Tenho até mesmo vontade de fazer um enterro simbólico com caixão e tudo o mais, mas sei que meu pai, que nada tem com isso, ficaria muito triste em saber que eu comemoro o mal aos meus “ex-avós”.
Preciso agora dar rumo a minha vida combalida. Tenho de me decidir se volto ao aconchego da casa dos meus pais ou se procuro uma nova casa para, no momento, alugar. Ainda não me decidi, ainda não faço idéia de para que lugar eu vou. Mas não posso esperar muito, o tempo corre como um velocista olímpico. Saí de casa ontem à tarde. Despedi-me da casa que chamei de lar por 13 anos de infância e 6 anos de vida adulta. Despedidas sempre são tristes, por menor que sejam. A última passeada pelos cômodos em silêncio, mergulhados na escuridão melancólica das janelas fechadas provocou-me uma sensação fúnebre. Não chorei, mas foi por pouco. Em compensação minhas pernas tremeram tanto que cheguei a pensar que estava a ter uma crise de hipoglicemia, mas para meu alívio era só o nervosismo.
Hoje dormi na casa de Mariana. Depois de uma semana sem tê-la comigo, finalmente ela chegou para me fazer esquecer um pouco todos os problemas que têm me mutilado. Logo mais irei para a casa dos meus pais e decidirei com eles qual será o melhor caminho a seguir. Não posso ficar assim por muito tempo, é preciso arregaçar as mangas e lutar por alguma coisa que eu acredite. O problema é que não acredito em nada.

quarta-feira, 19 de março de 2008

De volta à vida de acontecimentos conturbados

Finalmente volto ao Vida de Escritor, depois de quase um mês sem publicar nada no blog. Se a idéia inicial deste instrumento era contar a dura vida de dois frustrados escritores em peripécias incríveis para compor um simples texto, que teimava em não ser escrito, agora, tenho o enorme prazer de dizer que não há mais postagens constantes pelo simples fato de eu estar atolado em palavras na composição de mais um romance. Para a minha alegria, parece-me que esse vai ao cabo antes do planejado. Já o nosso querido amigo Jean continua ausente desde que foi para a Califórnia brincar de The O.C., sem sofrer o seu papel nesta empreitada. Tudo bem, vamos dar a ele um desconto, afinal cursar uma faculdade na terra de Bush não é moleza nos tempos atuais. Assim, deixemo-lo — que construção sintática formosa — de lado, pelo menos por enquanto.
O ano de 2008 não começou como eu havia imaginado. Depois de enfrentar um mês de janeiro parco, sem muitas palavras e pouquíssimos textos realmente prontos, em fevereiro comecei a escrever um conto apenas para passar o tempo ocioso antes do turbilhão de trabalho se iniciar, roubando todo o meu vigor. Sem que eu imaginasse a brincadeira textual cresceu tanto que de conto já não tem mais nada. Tornou-se um romance mesmo, curto, é bem verdade, mas não deixa de sê-lo. Fazia tempo que eu não me sentia tão bem em escrever uma narrativa. Agora mesmo me pergunto por que diabos estou aqui, escrevendo este texto em vez de continuar as discussões de Almira e Roberto, os protagonistas da minha história. Tenho uma data prevista para enviar o material, mas antes de implorar por atenção nas grandes editoras e rastejar às pequenas, chorando como uma criança para que avaliem a qualidade do texto, enviá-lo-ei — hoje estou abusando da colocação pronominal — para concursos literários, a fim de roubar a cena e tentar ganhar um trocado para sanar minhas combalidas finanças, porque depois que rescindi o contrato — ou melhor, me alforriei — com a editora e dei um basta nas chibatadas de um editor ganancioso que não sabia fazer dinheiro, preciso encontrar outros meios de manter a conta bancária respirando, até porque o salário de servidor público não é lá grande coisa para se manter uma vida com dignidade. Aguardo impaciente pelo resultado do 13º Concurso Literário da FESP e, em breve, o do que escolherei para enviar o Intermitências Amorosas; é claro, se terminá-lo a tempo. O relógio corre nas suas intermináveis voltas e o meu contador interno anda muito devagar, em contrapartida.
Entre um parágrafo e outro, poetei novamente. Embora não acredite realmente que tenha feito bons versos, alguns poemas recentes me enterneceram de tal maneira que resolvi, mais obrigado pela Mariana do que por vontade própria, participar de concursos literários Brasil a fora. Depois do desencanto com esses malditos avaliadores, penso que já é hora de esquecer os traumas e dar minha outra face aos meus agressores. Espero que não volte a ser plagiado por pessoas medíocres e se, por obra do destino, eu for, espero que não seja membro da porcaria da banca que avaliará o pobre que rouba de outro pobre. Há quem diga que concursos são uma furada sem tamanho, mas ainda acredito que alguns deles tenham seu valor e respeitabilidade no meio. E por assim acreditar, fiquei feliz com o resultado que obtive neste primeiro trimestre do ano. Das quatro bancas sérias a que me submeti, duas me contemplaram com menções honrosas. Tudo bem que esperava por uma vitória ou, pelo menos, um terceiro lugar, mas ficar entre os dez primeiros entre ótimos escritores nacionais, já me basta por enquanto. Foi um bom incentivo para manter as investidas e, quem sabe, aguardar por resultados mais satisfatórios.
Nadando contra as ondas da plenitude, minha vida pessoal foge dos eixos. Novamente tive problemas com o carro. Eu, que acreditei na montadora francesa, quando troquei o inusitado japonês preto brilhante, agora peno com o peugeot encostado na oficina há um mês. Para meu desabor, o mecânico ainda não encontrou o problema que me fez empurrar o carro pelas ruas do centro, num desespero patético de ser multado por atrapalhar o trânsito na via. Parece que meus fantasmas automobilísticos jamais me abandonam, afinal o prejuízo e os sustos que me deram o malfadado civic são um pesadelo constante. O que mais me irrita nessa história é que amo dirigir e não posso fazê-lo. Sempre que tenho um problema, minha válvula de escape é guiar o carro pela estrada, correr — hoje bem menos do que antes — como se fosse um homem livre das pressões da vida. Infelizmente as circunstâncias me obrigam a caminhar pelas ruas num ritmo vagaroso e triste, cismando meus aborrecimentos.
Quanto ao trabalho, espero que não haja problemas de ordem financeira. Minha calculadora confidenciou-me que o ordenado será suficiente para me manter, digamos, bem neste ano, mas para que isso ocorra perfeitamente, tive que aumentar a carga horária semanal, buscando trabalho em mais uma escola. Seria absolutamente normal lecionar para mais turmas, porém trazer uma infinidade de redações para casa não me mantém contente, por isso parei de dar aulas de redação há dois anos atrás. Eu odeio passar meu tempo livre preso à mesa, corrigindo centenas de dissertações, dezenas de narrações e outras composições. Mas para quem precisa, não há escolhas, aceita-se o que vier.
Mas o pior de todos os males não é o carro, não é o trabalho, não é o texto. O pior que poderia ter me acontecido foi Mariana ter se mudado para o Rio nesta semana. Já era esperado que ela fosse cursar a faculdade na capital do estado, porém todos nós fomos pegos de surpresa com a data, uma vez que esperávamos pelo segundo semestre. Mais uma peça pregada pelo destino, numa seqüência de atos trágicos intermináveis. Quanto a esse fato, deixemos para outra oportunidade, pois ainda não me sinto preparado para escrever o que sinto sobre isso.
Voltemos ao texto. Almira e Roberto precisam descobrir o que será feito de suas vidas. É hora de eu voltar a brincar de ser deus, de ser destino.

2008, 18 de março

quinta-feira, 28 de fevereiro de 2008

Dias de Inferno



— Acontecimentos ruins nunca chegam sozinhos —

Esta tem sido uma semana difícil. Tão difícil que nem sei por onde começar o meu relato. Não sou uma pessoa muito supersticiosa, pelo menos não era, mas agora começo a acreditar que entrei numa fase negra. Devo ter passado em baixo de uma escada, topado com um gato preto, chutado uma macumba, eu devo ter feito algo para que os últimos dias fossem tão amargos comigo; uma sucessão de tristes episódios que me mancharam a alma havia pouco tenra, agora de luto grave e muito azarada. Estou perdendo a calma, a um passo do desatino, quase desistindo da luta amarga que é a vida.
A sina teve início na segunda. Trabalho novo, primeiro dia na escola nova, tudo transcorria bem até que descobri que o vazamento que tanto atormentava o vizinho do andar de baixo vinha do meu banheiro. Descoberto o problema que fez minha cabeça doer durante duas semanas de tanto ouvir as reclamações, não tive escolha e mandei o pedreiro quebrar tudo. Como resultado, tenho que correr a casa dos meus pais para tomar banho. Para piorar, eu me banho pelo menos três vezes ao dia, portanto está sendo um inferno manter-me asseado neste insuportável calor com meu problema de transpiração excessiva. Espero que até sexta-feira tudo se resolva, afinal esse foi o prazo estabelecido na contratação do serviço, mas pelo andar da carruagem, acredito que não será cumprido.
Por causa do desconforto no banheiro, ainda na segunda-feira, fui à casa de Mariana com o intuito de tomar um relaxante banho, mas voltei para casa com o rabo entre as pernas e ainda sujo. Os ânimos por lá estavam um pouco alterados e acabei presenciando uma discussão feia entre ela e a mãe. Embora o assunto fosse de mãe e filha, acabei inserido no centro das ofensas e tive minha parcela de culpa exposta para que eu pudesse julgar os nossos limites atualmente: quase nenhum. O cerco está apertando e nosso tempo praticamente escasso. Queria dizer que não fiquei chateado, mas não seria verdade. Profundamente magoado relutei muito em lá voltar, mas por forças superiores a minha vontade, não tive escolha. O que mais me dói nessa história é que em poucos dias Mariana irá estudar no Rio, logo só poderemos nos ver nos fins de semana e com o tempo estritamente limitado. Se a incerteza de como manteremos a nossa relação já é grande agora, não quero nem mesmo imaginar como será em nosso futuro próximo. Estou com medo, um imenso medo de que nosso romance comece a fazer água, uma vez que nos vemos diariamente e daqui para frente isso não será mais possível.
Como não bastasse a decepção que sentia, o pior ocorreu na terça-feira de madrugada. Telefonemas às quatro da manhã sempre dão medo. Os últimos que recebi eram trotes, mas mesmo assim, ficamos com receio de atendê-los. Geralmente atendo-o perguntando quem morreu para que me liguem a essa hora, mas ontem nem precisei perguntar. Quando minha mãe, chorosa, me ligou, sabia que algo extremamente ruim acontecera. Imaginei de imediato que havia sido a morte de meu avô, porque há poucas semanas ele fora internado e nos deixou intranqüilos com seu estado de saúde debilitado. Não estava cem por cento errado, para o meu pesar. Não, não era o meu avô de 93 anos, mas meu tio, seu segundo filho. Embora não nos víssemos há alguns, foi um choque saber que ele tivera um enfarte fulminante. No início pensei, ou melhor, quis acreditar que foi um sonho ruim, ao amanhecer tudo estaria normal como sempre fora, mas não. Eu não havia sonhado, era tudo real, infelizmente meu tio falecera num hospital frio de Niterói.
A dor que senti, e ainda sinto, foi lacerante. Tudo conspirava para intensificar o sofrimento. O estado de minha mãe, parecia ter sido atingida por um raio mortal; a sensação de perda; o fato de eu não poder ir ao enterro, porque não havia com quem deixar as crianças; tudo contribuiu para o meu desespero. Segurei minhas lágrimas o dia inteiro para não deixar meu irmão assustado, mas no fim da noite arrebentei num choro compulsivo. Sinto-me amargurado por não ter me aproximado mais dele, de conhecê-lo somente por histórias contadas com orgulho por meus tios e por limitar-me apenas às nossas breves conversas pelo telefone. Dor. Pena. Tristeza. Minha pobre mãe ainda este devastada; chora como um bebê abandonado numa noite fria. Ela está exausta, chora o dia inteiro e nada posso fazer para amenizar sua febre. Faltam-me palavras, faltam-me a frieza e a segurança para confortá-la em seu momento de agonia. Isso me corrói, me mata também.
Para encerrar a peça e selar minha queda, o Peugeot apresentou o seu segundo problema. Se o primeiro, com a troca da bateria ficou excelente, o de agora não aparenta ser tão simples o reparo. Não entendo muito de mecânica, mas me parece que o problema é no motor. Não estaria tão triste por isso, se não tivesse padecido tanto com o malfadado Civic, que em apenas um mês me levou cerca de dois mil reais. O barulho, cada estouro que eu ouvia, parecia um tiro seco vindo debaixo do capô. Ainda sinto minhas pernas tremerem e o ar fugir de mim. Não quero passar pelo período negro que me foi ficar sem carro novamente. Espero que o conserto seja simples e que não me leve o ordenado do mês inteiro, que já está mais do que comprometido.
Tantas coisas ruins acontecendo sem que eu nada possa fazer para evitá-las. Já não me animo mais facilmente, nem boas notícias me fazem rir ou me sentir menos mal com as intempéries atuais. Vejo o dia ficar cinza pela janela, uma imensa nuvem negra se aproximando e prestes a desaguar a pior das tempestades sobre a minha dolorida cabeça. Nem mesmo os títulos de menção honrosa no Concurso Literário Mendonça Junior e no Concurso Literário do Vale das Sombras acalentaram meu espírito. Talvez se viesse em outra semana eu teria ficado feliz, mas calhou de ser na época errada que as novidades chegaram; vieram junto com a chuva, que lá fora, começa a cair. Estou desesperado.

Alberto da Cruz
2008, 28 de fevereiro

sábado, 16 de fevereiro de 2008

Não gosto de apagar as minhas velas



Meu aniversário está próximo, menos de dois dias para apagar as velas de um bolo imaginário. Como no ano passado, neste também não terá bolo. Acho que desde que me descobri diabético não teve mais bolo em meu aniversário. Também não faz falta, porque eu odeio bolos de festa, aquelas coisas cheias de glacê, confeitos e açúcar suficiente para matar um formigueiro de hiperglicemia. Foi-se o tempo das festas, portanto este ano também não terei uma festa. Há algum tempo fazíamos churrascos para comemorar o meu dia, mas de uns tempos para cá os churrascos regados à cerveja e misturas alcoólicas foram perdendo a graça até não mais existirem. Meu aniversário perdeu a graça faz anos. Afinal, o que há para comemorar? É só mais um dia num ano de dias intermináveis, a única diferença é que eu nasci numa manhã quente de verão de 1981, justamente neste dia.
É fácil perceber que não gosto do meu aniversário. Não sei se é a desilusão com o mundo ou comigo mesmo, mas não gosto desta data. Não tenho o que comemorar; só mesmo lamentar as coisas que não fiz e as marcas expostas que o tempo deixa, minhas feridas purulentas que não cicatrizam nunca. Eu gostaria de saber explicar o motivo de tanta tristeza quando deveria ficar feliz, mas não o sei. Simplesmente sou acometido de um estar depressivo nos dias que antecedem a minha data natalícia e que perdura até a semana posterior. Sempre foi assim e deve continuar por muito tempo ainda.
Quando vejo as pessoas felizes e eufóricas em seus aniversários, não entendo o porquê de tanta alegria. Não consigo compartilhar desse sentimento, realmente não os entendo. Que diferença faz para ser tão diferente a véspera para o grande dia? Não são todos iguais? Ambos não possuem 24 horas? Não começam na hora zero e terminam a meia-noite? Então por que tanto estardalhaço? Devo ser mesmo um homem amargo. Não gosto de Natal, por isso tanto me atormentam aquelas mensagens idiotas que dizem da boca para fora. Não gosto ainda mais do meu aniversário, não por esquecerem de mim, mas por pessoas que realmente me são caras não lembrarem de minha existência sequer uma vez no ano e, neste maldito dia, vêm me dar parabéns por estar mais um ano me arrastando qual morto na tumba neste mundo miserável.
Não, eu não gosto do meu aniversário e dos dias que o antecedem também. Tenho medo de tudo, das coisas que imaginei e sei que não se concretizarão, dos meus sonhos que morrem cedo demais, de tudo aquilo que quis viver e que jamais viverei. Estou desiludido demais para festejar o que quer que seja. Nada me anima, só desencanta. Viver passou a ser um martírio cada vez maior, um imenso fardo que já não consigo carregar. O mundo está pesando demais sobre meus ombros. Mal posso me sustentar. Minhas pernas estão bambas. Sinto que vou cair a qualquer momento e não posso fazer nada para evitar que isso aconteça. Estou fadado a um fim trágico, sem alegria e sem sorrisos. Temo o que me espera no fim do corredor, na última porta a ser aberta. Que monstro cruel me espera lá dentro para assombrar meus sonhos, meus pesadelos cruéis?
Reminiscências cruéis me assolam como fantasmas raivosos. Cometi muitos erros em minha vida e, talvez por isso, queira fugir deste universo recheado de hipocrisia o quanto antes. Sempre penso na morte em meu dia especial. Sempre penso em como será e quem sentirá a minha perda, se é que farei tanta falta para alguém ao ponto de minha ausência ser sentida. Se eu gostaria de ser diferente? Igual aos outros? Obviamente. Mas não o sou. Tenho a pena da melancolia manchando minhas páginas amargas, tenho uma tristeza depressiva inerente às minhas vontades, um não sei quê de soturnidade vazando pelos meus poros. Mas um dia tudo vai mudar, eu sei que vai. Só resta saber se ainda terei tempo de ver isso acontecer com o mínimo de sanidade possível.
Amanhã é meu aniversário e já estou farto de fazer pedidos que nunca se realizam e soprar velas imaginárias ao meu desgosto.

Alberto da Cruz
15-16/02/2008

terça-feira, 8 de janeiro de 2008

Esboços de um conflito e a arte do contentamento


Depois da interminável quantidade de trabalhos do mês passado, fiz questão de dar-me merecidas férias textuais. Assim que terminei o material para o 13º Concurso Literário da FESP não mais escrevi uma linha para nenhum fim, afinal compus como louco em novembro e dezembro para conseguir finalizar os escritos antes que meu prazo findasse, era de se esperar que eu chegasse à exaustão física e mental, mesmo ainda deixando alguns trabalhos em aberto, como o romance Minha História, que nasceu da mesma idéia do conto “A menina dos meus olhos”. Embora as duas histórias possuam o mesmo tema central, rumam por caminhos diversos. Obviamente o romance é mais denso do que o conto, afinal os gêneros literários existem para que as obras não sejam iguais. Gostaria de dar cabo logo ao romance, mas ando um tanto blasé com a literatura. Até mesmo este pequeno texto me é sofrível para escrever. Parece, e não sei o porquê, que perdi, momentaneamente, o tesão pelas palavras. Tenho vontade de escrever da mesma forma que um homem impotente tem vontade de deleitar-se com o sexo, ambos ficamos na vontade imaginando o ato de prazer. Quero escrever, mas não consigo. Perco a paciência ainda no primeiro parágrafo e largo o texto ainda menino como um mãe que abandona o rebento a sua própria sorte. A criança ainda pode crescer, mas minhas palavras sem o meu afeto não chegam nem a infância das letras.
Estou cansado, essa é a grande verdade. Cansado de lutar contra minhas limitações e por uma revolução íntima que nunca chega. Ando desacreditado com meus pensamentos e, principalmente, brigado com meus ideais. Não sei se o grande motivo para minha regressão artística foi a falta de bons resultados atualmente ou simplesmente o tédio somado a um langor absurdo que me tolhe não só a criatividade como também a própria vontade de manifestar meus desejos e expor sonhos no papel. A vida de escritor é dura, portanto sem perseverança é praticamente um fardo pesado demais para carregar. Por isso ainda não me decidi se espero pelos resultados até meados de março para continuar os projetos inacabados ou se ponho fim às minhas férias e mergulho definitivamente no mar de palavras e pensamentos bizarros que me povoam a mente tão cheia de conflitos.
Não estou muito bem pessoalmente. Vida atribulada e repleta de paixões. Talvez se conseguisse separar os meus tormentos, realizaria melhor minhas tarefas, mas não consigo abstrair um problema de outro. A vida amorosa está oscilando muito e isso tem sido prejudicial para o bom andamento de meus delírios.
Pronto. Perdi a paciência outra vez. Agora quando estiver mais tolerante regresso ao texto.
***
Insisto para terminar este mal-gerado absurdo dois dias após largá-lo ao meio como se estivesse pronto ao lixo. Não é por falta de assunto que ele rasteja como um animal ferido prestes a morrer. Assunto não me falta, o que desapareceu foi talvez a tranqüilidade costumeira que me tomava quando me ponho a escrever, quando me punha a escrever.
O ano não começou nada bem e eu devia ter me atinado aos detalhes que marcaram a passagem dos meses. Tudo bem que no momento em que 2008 se desenhou e eu vi seu esboço, acreditei que seria esplêndido o seu começo, mas não devemos acreditar em esboços sem conhecer de fato o artista e o seu trabalho final. Confiei e me decepcionei com a obra pronta nos primeiros dias do ano. Fora uma exposição de pesadelos.
Como eu disse já faz algum tempo, precisava enfrentar a dura realidade de minhas amarguras passadas na comemoração da festa da virada de 2006-2007. Piamente acreditei que só haveria uma maneira de espantar o fantasma da Praia do Sono de minhas noites insones: dessa vez também ir, cedendo às minhas vontades, para acompanhar Mariana em seus desejos. Fui, mas faço um adendo. Não é preciso mencionar a beleza do lugar e a tranqüilidade que 4 dias em meio a natureza causam em nós, criaturas urbanas, dependentes de tecnologia como uma droga vital a nossa existência vã. Acontece que constantemente me perguntava desolado se aquele lugar era mais importante do que eu e meu amor incondicional. Acreditar que fui trocado pelas noites de algazarra por aquela a quem meu coração aponta como, bem-dizer, segurança aos meus dias conturbados era um mal que me feria o íntimo, sem remédio para aliviar as fortes dores perpetuadas na alma — que hipérbole! Apesar de descontente, procurei abstrair-me dos erros e me divertir com ela passou a ser o mais importante. Afinal, havia um bom motivo para estar ali: Mariana, sempre Mariana. Era a oportunidade que eu tanto esperava para enfim dormimos juntos, pois em pouco mais de um ano de namoro, conta-se nos dedos as vezes em que demos um beijo de boa noite e acordamos juntos num sorriso pleno ao dizer bons dias ainda com os corpo colados como se fossem um só, sentindo o calor da pele despida aquecer nossos desejos. E claro que nos faltou o conforto de um quarto, mas em seus braços até o colchão inflável e a pequena barraca abafada era o paraíso.
Há quem pense que me curei do mal, mas não. Atenuadas as mágoas, mas não de tudo findadas. Às vésperas do Ano Novo, faltando menos de uma hora para os fogos iluminarem o céu, nós brigamaos novamente e, novamente por algo que poderia ser evitado. Punhamos em risco a alegria festiva. E confesso que naquele instante senti raiva dela; um sentimento tão avesso que me fez repeli-la como se me fosse algo nocivo. Até que os ânimos se acalmassem foi horrível olhá-la, senti-la, amá-la. Conseguimos, porém, esquecer, pelo menos momentaneamente, as nossas desavenças e partilhamos da comemoração. Se havia o que discutir, ficaria para o outro dia, menos tensos e mais racionais. Porém o que se iniciava ruim ganhou proporções ainda maiores.
Um dos nossos companheiros de viagem nos informou que fomos roubados. Conhecendo seu espírito brincalhão, demorei a acreditar que dessa vez ele dizia a verdade. Em passos apressados chegamos ao camping em que estávamos e a decepção abateu-se voraz sobre todos nós. Era verdade. Todas as nossas barracas, somente as nossas dentre dezenas, tinham sido violadas. Felizmente, nossas coisas não foram levadas, nem mesmo nossos poucos Reais foram encontrados, mas aos nossos amigos o destino foi diferente, uma sucessão de desgosto e desespero os tomou de espanto quando se constatou que muito deles foi levado: dinheiro, bens materias, fora a bagunça feita em todas as coisas. Era o fim da festa, pelo menos foi por algumas horas. Embora tentássemos salvar a comemoração e nos divertirmos com o que nos sobrou, foi impossível não voltar nossa noite a falta de sorte que tivémos. No dia seguinte, para espanto de todos os demais acampados, ríamos do ocorrido enquanto contabilizávamos o que nos sobrara para voltarmos para casa.
O ano começou mal. Digo isso não só pelo que nos aconteceu no Sono, mas também pelo clima tenso entre mim e Mariana na semana de regresso. Chegamos terça e quinta, por pouco, não se findam todos os esforços, lágrimas e sorrisos que dividimos. Aquela velha história de que um acontecmento ruim atrai outro que por sua vez atrai mais outro e assim sucessivamente. Brigamos como nunca antes. As profundas mágoas ainda latejavam em nossas cabeças e eu, que de amores por ela morro, resolvi que era melhor enterrar nossa história de vez por não aguentar mais os deslizes impensados de nosso relacionamento.
Nunca vi Mariana chorar como a vi naquela quinta. Jamais imaginei que o que ela sente por mim fosse tão forte a ponto de fazê-la soluçar, chorar e gritar como meio de fazer-me mudar o pensamento. Discutimos por horas e nesse interlúdio triste, propus o nosso fim, apesar de nos amarmos. Não era possível continuar sem que o respeito pelos pequenos detalhes existisse. Seria viver o próprio inferno ter a vida sem ela, mas eu não mais suportava as mágoas que me varriam o peito. Eu que já passara por outras desilusões na vida, já experimentara tantos amores, já vira ruir tantos sonhos, já recomecei tantas vezes esquecendo velhos amores, pensei que não seria diferente e esquecer também dela seria como foi com as outras que por minha vida passaram. Com Mariana sempre foi diferente, eu não poderia esquecê-la nem levar a vida como se ela não fizesse parte de mim. Recobrei a consciência a tempo, antes que o mal jamais pudesse ser desfeito. Puxei com força para meus braços e calei seu choro infantil em minha boca. Foi nosso beijo derradeiro, a hora em que percebemos que o amor que temos um pelo o outro supera toas as diferenças e faz o passado ingrato morrer. E eu a amei mais.
Parece-me que precisávamos enfrentar a desordem dos nossos pensamentos para nos certificarmos que queremos cultivar nossa história. Foi duro e quase vimos nossos frutos despencarem antes do tempo, mas felizmente a colheita foi salva depois da tempestade. Hoje vivemos os nossos dias de glória e ainda mais apaixonados do que antes. Nosso amor cresce a cada dia, solidifica-se a cada hora. E nosso futuro se desenha, não num esboço de um artista desconhecido, mas pelas mãos de um gênio da arte.

Alberto da Cruz
2008, 08 de janeiro

terça-feira, 18 de dezembro de 2007

O revés do desgosto

Sempre que discutimos sobre alguma coisa que ocorreu conosco, Mariana me diz que eu só lembro os fatos ruins, como se não existissem bons momentos em nossa relação. Obviamente, no calor insuportável de nossas brigas, eu só menciono as palavras mal interpretadas ou as ações impulsivas que provocaram algum tipo de sofrimento, na maioria das vezes em mim. Acredito que faça parte dessa hora em que a tensão misturada com a raiva ganha a razão em um jogo desigual. É difícil ponderar quando o sangue está fervilhando. Os erros vêm novamente à tona, não por maldade, mas acabam saindo sem que eu perceba os danos que causo com minhas palavras rudes em meus estúpidos momentos de raiva — e ultimamente eu tenho andado como um cão raivoso, perdendo a paciência facilmente e agredindo qualquer um que me olhe atravessado. O estresse do fim de ano acaba comigo, embora eu tente lutar tenazmente para manter a calma. São provas intermináveis para corrigir, dezenas de diários para fechar, reuniões extraordinárias, conselhos de classe, contas a pagar, textos para entregar, fila de banco, fila de correio, presentes de natal, escolhas, decisões e eu cada vez mais nervoso com o pouco tempo que me sobra em meio dessa loucura toda.
Como as intempestividades ocorrem sem que possamos mudá-las, faz-se necessário domar a fúria negativa que me assola como um leão faminto numa jaula, pois, caso contrário, suas garras podem dilacerar facilmente aquele que provém seu alimento. Não é diferente conosco. Quando brigamos, acabo dizendo o que era melhor calar, a fim de não ferir. O grande problema é que não me calo e, agindo como um violador de túmulos, desenterro mágoas que deveriam há muito ter sido esquecidas. Não lembrar as dores passadas é essencial para a construção do futuro quando não trazem nenhuma lição importante. Não é que não a tenha, mas não se faz preciso dizer do que já foi. Devemos, pois, olhar adiante e buscar novos caminhos para deixar as coisas melhores, sem a sombra do pesar. Não sei ao certo, mas me parece que lentamente estou aprendendo sobre minhas dores na alma, deixando descansar em paz os mortos de minha mente, lutando contra meus fantasmas. Mas não me tem sido fácil enfrentar essa horda nociva sem sair ferido do combate.
Se no momento de mágoa deixo escapar os tormentos, não quer dizer que a nossa vida a dois seja um eterno desgosto, pelo contrário. Passamos juntos os melhores momentos que já vivi. Nada se compara a ternura de um dia com ela. Quando solitário em minhas ilusões ouço o telefone tocar, com o coração a bater desenfreadamente, espero que seja ela do outro lado da linha. É difícil explicar a alegria que me toma quando ouço sua voz gostosa me dizer palavras simples como apenas um “oi”. Quando vejo seu sorriso depois de um dia cansativo de trabalho, meu mundo inteiro parece parar para admirá-la e o cansaço se esvai rapidamente, surgindo em mim uma força que nem sequer imaginava existir. Ao encontrá-la, num abraço saudoso, sentir o calor de sua pele é o contentamento contra as minhas frustrações diárias. Em sua boca morre minha inquietude quando me aprazo com seus beijos carinhosos de ternura. E quando detenho seu corpo delicado sob o meu, bruto, sou uma fênix renascendo das chamas do meu caos para uma vida muito mais cheia de amores.
Nessas horas de deleite, não há mácula que perdure. Todos os sentimentos de desgosto se vão ao primeiro toque, às vezes nem mesmo isso, pois somente um olhar choroso seu me faz retroceder em minhas decisões impensadas e correr para os braços como uma criança carente aos braços da mãe. E a amo mais, muito mais do que antes, pois só a possibilidade de perdê-la me faz entrar em pânico. Quando a vejo, ainda sinto tremerem minhas pernas e meu coração bater muito mais forte. Se isso é paixão, o fogo voraz que queima rapidamente e logo se apaga, esta dura mais e mais e mais, chegando ao ponto de se fechar um ciclo anual e ainda assim o calor no corpo é o mesmo em proporção crescente do que no início de nosso sério compromisso. Certamente o que temos não é paixão, é mesmo Amor. E não é só desejo, nem um laço físico. O que temos transcende os limites corpóreos e sobe aos céus sublimado.

terça-feira, 11 de dezembro de 2007

Perdoar e esquecer não é para qualquer um



Dos meus defeitos, e não são poucos, talvez o pior seja não esquecer o que me magoou, independente de quando ocorreu o fato feito em meu desagrado. Sei que isso é prejudicial não só a mim, mas também às pessoas a quem eu me relaciono, mas não consigo deixar de pensar no que aconteceu, foi dito, ou não. Parece-me que é recente, apesar de ter sido há muito tempo. A dor é a mesma, a raiva é igual e o desapontamento é tão grande quanto no dia exato em que me senti agredido, ferido e humilhado.
Mesmo que me peçam desculpas por me magoarem, não consigo perdoar totalmente. As desculpas não fazem a ferida no peito parar de doer. Amenizam o estrago causado, porém não apagam o mal que me foi feito. Se são necessárias então? Obviamente sim. É o mínimo que o errante pode fazer para diminuir um sentimento de desgosto provocado por um descuido impensado. Não sei perdoar os erros dos outros, apesar de querê-lo. Minhas cicatrizes são expostas e sensíveis, voltam a doer a qualquer instante, com a mínima lembrança. Fecho o cenho no mesmo instante, franzo a testa com a mesma intensidade e, não raro, trato com desdém como se fosse hoje o mal feito ano passado, retrasado, dez anos atrás. Guardo mágoas como utensílios não usados cotidianamente em baús da memória, prontos para serem revelados caso precise. E não é por querer ferir quem me feriu em uma vingança infantil que faço questão de recordar a quem me causou a tristeza à proporção do meu ressentimento, embora tenha um pouco disso, não é o principal. Faço para que não se esqueça da falta; para que não se repita da mesma forma; para que se lembre de que pequenos gestos maltratam o coração. Mas lá no fundo, sinto-me satisfeito por fazer com que esse mesmo erro doa, como um tapa violento, no rosto de quem mo deu. Não sou de tudo uma pessoa vingativa, mas sou humano, não um mísero inseto sem a dádiva do sentimento.
Cazuza — novamente ele — conseguiu expressar um lado positivo nisso num verso genial de Muito obrigado (por ter se mandado), quando diz “pelos dias de cão, muito obrigado (...) me trair, me dar inspiração preu ganhar dinheiro”. Óbvio que a dor que se sente é lacerante, mas tenho que usar de artifícios para transformá-la em algo, no meu caso, arte. E quando ganho o meu suado dinheiro com ela, preciso agradecer pela iluminação artística. Mas queria antes de tudo não tê-la. Tenho-a e por isso hoje escrevo. O que me levou a pensar estas pobres palavras hoje foi um fato passado que já deveria ter sido enterrado e devorado pelos vermes, contudo, como já expliquei, é difícil demais para eu deixar as cortinas caírem para encerrar o drama da minha vida.
Quando Mariana me comunicou que passaria a virada do ano com os amigos na praia do sono, apesar de nosso romance ser ainda um broto que precisa de cuidados para não morrer, senti-me desfolhado, seco e prestes a morrer. Acredito que em um namoro — que não me condenem os que de mim pensão diferente — o casal queira compartilhar todos os momentos alegres e nunca, jamais passar uma data significativa afastados por vontade própria. Sua decisão me fez , na época, pensar em terminar imediatamente com a relação que começava a engatinhar. Se no início, quando é normal que se queira ser inseparável, ela me deixou a ver navios, o que seria do futuro? Eu veria do porto as embarcações afundarem sem que eu nada pudesse fazer? Foi um golpe duro que me faz lastimar até hoje. Embora eu quisesse passar por cima disso, perdoar e esquecer, é impossível. Penso em até quando vou suportar a dúvida e aceitar suas ações que contrariam minhas convicções. Como eu disse, desculpas não desfazem as faltas nem fazem parar a dor. Eu a desculpei depois de uma longa discussão, mas não posso perdoá-la ainda, nem sei se poderei um dia. Que isso é nocivo para nós e corrói qualquer estima é verdade, mas como proceder se esse fantasma ainda me assombra?
Sou, por ela, apaixonado, mas as decepções que infelizmente tive me fazem ainda pisar com cuidado por ter medo de me machucar mais do que já me machuquei. Não só apenas esse triste episódio do início me melindrou, outros tantos ocorreram sucessivamente nos primeiros meses que, penso eu, deveria ter usado a razão e dar como encerrada a tentativa de relacionamento com alguém tão diferente de mim, não só em maturidade, mas também em pensamento. Tivemos, ou temos, bons momentos que me valeram muito, claro que não me esqueço deles, mas os dias negros também são de verdade, e a escuridão me assusta por temer que se repita, apesar de não querermos. Sei que hoje ela é diferente e valoriza nossa união, mas o antes existiu, não se pode ignorar. Gostaria de saber como estaríamos agora se minha reação fosse outra, se não tivesse lhe dado as chances que dei, se não tivesse relevado suas inúmeras falhas comigo, coisas, a meu ver, tão graves que, em outros tempos, jamais aceitaria.
As pessoas, embora não reconheçam, vivem hipocrisias. Lembro-me de Gregório de Matos em seu “pequei Senhor, mas não porque hei pecado”, como se pecar fosse motivo para Deus ser feliz na glória da absolvição. Não sou Deus, nem passo perto de sua bondade, portanto não me venham com essa história de me contentar com um pedido de desculpas quando se sabe que seus atos egoístas provocam sentimentos ruins naqueles que os querem bem, a fim de abrandar a ira de sofrer o desengano.

segunda-feira, 19 de novembro de 2007

Quatro dias de lástimas

Quatro dias, alguns poemas e fragmentos diversos, esse foi o saldo do feriado de 15 de novembro, para meu desgosto. Faz um bom tempo que não escrevo para a coluna. O tempo foi gradativamente diminuindo, juntamente com minha paciência. Outubro foi uma lástima para mim e minhas composições, em todos os sentidos. Já enfrentei dificuldades em outras vezes, mas há muito não me aconteciam momentos de total pane mental como esta última. Parece-me que o hiato criativo voltou a fazer parte de minha vida, deixando assim uma lacuna incrivelmente ampla, separando-me da redenção ao terminar um texto, qualquer que seja ele.
Gostaria que minha vida estivesse no eixo, mas anda descentralizada, por isso é tão penoso dar continuidade às atividades que começo. Ando muito blasé com minhas peculiaridades. E também uma onde depressiva virou meu barco. A solidão voltou a me acompanhar e uma tristeza inexplicável veio somar no meu trágico caminho os passos atrás de mim.
Antes de começar a choramingar minhas amarguras, boas notícias: estourando o prazo para entrega, enviei para o Concurso Literário Lúcio Lins o livro de poemas “Lírica Imperfeita”, em que, depois de um longo processo de escolha, compilei, com Mariana, as 60 páginas que o compõem. Escolhemos cerca de 50 poemas escritos entre o começo do ano e os primeiros dias de novembro. O difícil foi deixar de lado alguns bons textos, já que o espaço era limitado. Agora só me resta esperar pacientemente para que saia o resultado final. Conhecendo-me suficientemente bem, não deposito muitas esperanças na vitória, já que em âmbito nacional sair-me vitorioso dentre excelentes novos escritores é muita pretensão de minha parte. Pensei até mesmo em desistir de mandar-lhes meu volume poético, mas minha fiel incentivadora vetou meu pessimismo latente, obrigando-me a enfrentar a imensa fila dos correios e despachar o envelope com os meus delírios.
O pior de tudo é que não participo do concurso somente com o desejo de vencer e ser reconhecido, mas o que mais motivara a minha investida foi a premiação em dinheiro, além da publicação de 500 exemplares da obra. Vejamos o que dará, mas não estou confiante de que conseguirei ir muito longe. Afinal, aos olhos da crítica, meus versos de amor, paixão e erotismo não são muito originais, mas também não decaem na poesia social tão aclamada e, ao meu ver particular, um tanto quando chata. Prefiro cantar o amor de um dia a versejar sobre acontecimentos do dia a dia, política, miséria ou outro desses acontecimentos universais. Em minha concepção pobre, o sentimento humano deve ainda ser cantado, pois o homem é todo sentimento, seja ele bom ou mal.
Já que comecei, não irei parar, pelo menos por enquanto, de expor-me a galhofa em concursos de literatura, grandes ou pequenos, profissionais ou amadores. Portanto, hoje enviei quatro poemas a dois concursos; o desconhecido “Concurso Literário da Ordem dos Dragões” e o “Concurso de Literatura Gótica”, promovido pela Boca da Serpente. Ainda resta-me escolher os 3 poemas e 3 contos para o Concurso Literário da FESP. Esse anda me tirando o sono, já que não consegui ainda escolher os trabalhos que serão enviados à comissão julgadora. O prazo caminha para o fim e eu não consegui pensar em nada. Isso me assusta muito, pois mais uma vez estou de olho no lucro.
Infelizmente tenho de pensar também no fator financeiro. Canso de ouvir e dizer que literatura, no Brasil, não dá dinheiro, não põe a mesa de ninguém; que deve ser vista como um hobby qualquer. Não é mais possível pensar dessa maneira, pois o tempo, as privações, as escolhas as quais nos submetemos para criar algo apresentável, no mínimo, há, de alguma forma, de ser recompensada. Só não gosto de título de Mercenário das Palavras, mas já as chamei de prostitutas baratas mesmo.
Talvez seja por esse trato rude que tem sido um tanto difícil lidar com o texto. Não sei se é apenas uma fase ruim dentre tantas outras ou a mais límpida verdade: não levo jeito para a prosa. Tenho, nos últimos anos, escrito uma série de histórias que se desenham em minha cabeça, mas no exato momento em que as materializo, parece-me que perco no processo a essência do texto. Eu, que adoro contar histórias, talvez não saiba contá-las. Aproveitei o feriado para reler algumas narrativas e achei-as, no alto do meu senso-crítico, ruins. Como se eu não conseguisse captar o sentimento exato que me propus a dizer. Talvez, o que parece mais infeliz, é que eu não tenha nada a dizer. Óbvio que nem tudo é uma premissa triste, há uma historieta ou outra que me faz brilhar os olhos, mas é pouco diante tantas outras. Ainda no meu lado torto, percebi que tenho sim o ímpeto criativo, as idéias florescem e as inicio de forma primorosa, mas é só isso. Geralmente não passo da introdução do que é bom, dos ruins, chego ao fim.
Antes, sofria para rever cada página. Só me adiantava no trajeto, depois de corrigir, lapidar as frases, dar coerência aos parágrafos, mas a trama acabava por não sair devido à demanda de tempo gasto na minha mania de perfeição. Assim que decidi escrever como um louco, sem voltar uma página para rever as falhas, consegui chegar ao fim do caminho, mas os passos foram tão vacilantes que a maior parte do que lá está, considero um lixo desnecessário à formação das vidas expostas em minhas vazias palavras. Eis que me surge um dilema: escrever um bom quantitativo que deverei excluir ou padecer em busca do ponto exato? Realmente não sei como devo proceder.
Felizmente, embora o período não seja dos melhores, a poesia se fez clara novamente. Consigo escrever alguns versos e, pela primeira vez, realmente gosto do que tenho feito. É sabido de todos que tenho aversão aos meus poemas, mas tenho me enternecido com algumas composições. Até mesmo as composições que versam sobre o amor me têm feito sorrir, devo, é claro, agradecer a Mariana por isso, pois sem ela a tarefa seria sem sentido. Uma efusão de novas sentimentalidades me fez soltar o que antes era contido e, sem cair naquela melancolia extremada romântica, as palavras voltaram a bailar ao som da minha valsa enamorada. Minha intenção poética não é ser piegas, embora às vezes chegue a ser, mas exaltar as formas boas de um sentimento puro. Já compus a ela material suficiente para um livro inteiro, sem mediações, todos em sua homenagem, sejam eles de realização, felizmente a maioria, sejam eles de momentos de frustração, muito mais do que deveria ter. Dessa forma, um acalento a minha alma mais ou menos de poeta, faz com que eu tenha esperanças de novo, apesar da melancolia que vaza pelos poros.
Na sexta-feira última, fiquei incomodado com um episódio que sempre me foi comum. Lia alguns poemas recentes para minha mãe, atividade mais do que normal, pois gosto de ouvir seu veredicto sobre tudo o que faço em minha vida. Até mesmo quando não concordamos sobre o assunto, sua opinião é fundamental. Claro que prefiro quando ela demonstra satisfação no que lhe apresento aos vetos que me faz pelo que rejeita, mas, em ambos os casos, é quase vital sua sincera avaliação. Em meio a essas leituras, cada vez mais me irritava com seu sarcasmo e assimilações com meu passado enterrado. Aquilo me gerou um mal-estar muito grande, pois em momento algum as estrofes referidas aludiam ao que foi, na época, traumático em minha vida. Fiz menção de parar a leitura, mas diante de sua insistência, continuei. Não devia tê-lo feito. Minha mãe explodiu num choro compulsivo que me deixou pasmo. Perguntei-lhe o que havia dito que a deixara naquele estado e a resposta foi surpreendente. Ela me disse que meus poemas parecem ser feitos, não para mim, mas para ela. Como se os sentimentos ali expostos, despidos de qualquer julgamento, trouxessem à tona o que ela sufocara durante seus anos de amargura.
Fiquei muito abalado e interrompi a leitura quando ela me perguntou sobre o que me motivara a escrever aqueles poemas. Disse a verdade, que não fora nenhum episódio meu, apesar de algumas coisas refletirem sensações que me assolam, mas projeções da vida, idealizações de acontecimentos, personagens que me faziam escrever sobre seus tormentos.
Pode parecer sadismo, mas aquilo me deixou satisfeito. Finalmente percebi que meu objetivo foi atingido: provocar em meu leitor sensações, levá-lo a identificar-se com o meu texto, tirando-o de mim. Relacionei o episódio com Fernando Pessoa em seu “Autopsicografia”, “o poeta é fingidor” e “os que lêem o que escreve na dor lida sentem bem, não as duas que ele teve, mas só as que eles não têm” como também em “Isto”, que de perfeita forma, sintetiza tudo o que lhe disse naquela noite: “Dizem que finjo ou minto tudo que escrevo. Não. Eu simplesmente sinto com a imaginação. Não uso o coração”, para fechar com o verso mais significativo que conheço: “Sentir? Sinta quem lê!”
Depois disso, parece-me que o motivo para a literatura voltou a mim. Tanto tempo imerso na escuridão fez-me esquecer que basta apertar o interruptor para que se faça a luz. Posso não ser um escritor brilhante, mas também não sou o inútil que imaginava ser.

Alberto da Cruz
2007, 17 de novembro
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terça-feira, 13 de novembro de 2007

Malditos Erros


"Errar é humano,
Depende de quem erra."

Às vezes cometemos erros em nossas vidas sem nos darmos conta dos males que podemos fazer com nossa falta de consciência. Um minuto é suficiente para fazer ruir qualquer alicerce, pode facilmente pôr abaixo qualquer edifício, independente de seu tamanho, seja pequeno ou absurdamente imenso. Falhas, o homem é cheio de falhas. Umas menores, completamente aceitáveis na sociedade; outras, de tão escabrosas, são motivo de condenação por um pequeno grupo, por uma pessoa apenas, não importa, pois a pena ao erro é sempre medida na proporção da dor que causa.
Não cometi um erro apenas. Ontem eu cometi o erro da minha vida. Estupidamente pus toda a felicidade que um dia tive à lona. Deixei triste aquela que me faz sorrir. Transformei um sonho lindo em um pesadelo mortal. Quando eu disse ao telefone “acabou”, pode ter doído nela, mas foi meu peito que sangrou. Quando eu disse “acabou”, as lágrimas escorreram em seus olhos, mas foram os meus que queimaram em brasas. Quando eu disse “acabou”, seu peito bateu descompassado, mas o meu parou. Cometi o erro derradeiro de uma vida errada. sem pensar no que fazia findei o que me motivava. Quis tirar de mim a bondade e fiquei com a agonia. O que fazer agora? Que trágico destino terei eu a partir de hoje. Como terei uma vida inteira sem ela se apenas um minuto é insuportável? Como irei respirar se ela é o meu ar?
As conseqüências de atos malfadados derrubam até mesmo os colossos, e eles, seres gigantescos, têm a queda maior e mais sentida do que as pequenas formigas quando desabam de vários metros de altura. Minha queda é descomunal, sem pára-quedas ou cama amortecedora. Vôo em direção ao chão como um pássaro morto, em alta velocidade; ou ainda, como um imbecil que assiste à lutas na tevê e pensa que pode derrotar um Acelino Popó em um combate, o preço da audácia é a lona. Cá estou eu a ouvir o juiz fazer a contagem regressiva. Em minha cabeça sua voz pausada anuncia os números como se estivesse dentro do olho do furacão, tudo é dissonante.
Fugindo da verdade, gostaria de que existisse a máquina do tempo. Seria ótimo também se o preço para usá-la fosse acessível aos, como eu, simples mortais. Voltaria hoje a algumas horas atrás e refaria minhas últimas encenações. Evitaria o quarto gole no conhaque, não tomaria sozinho a quinta cerveja e me manteria dono da minha consciência. Mudaria muito se estivesse sóbrio, mas não estava, portanto a volta ao começo do drama seria a solução. Mas se voltar ao no tempo fosse possível, por que voltar ao fim e não ao início, onde todos os múltiplos problemas realmente começaram? Fácil, porque apesar de aborrecimentos esporádicos, outros nem tanto, houve momentos inesquecíveis que não poderiam jamais ser apagados. Houve sorrisos que nunca mais serão dados. Houve beijos apaixonados como se vê nas novelas noturnas. Houve carinhos impagáveis e abraços tenros. Não só decepções aconteceram, e elas foram terríveis, mas também tivemos nossos momentos diáfanos. Voltar e mudar, portanto, seria trucidar essas boas passagens da vida.
Seria bom fugir da realidade, mudar o que não gostamos, mas a vida nos ensina com as nossas falhas. Que lição aprenderíamos se não tivéssemos a sombra da decepção. Como edificar um bom homem sem conhecer os males da vida. Dizer que se retira dos livros as experiências que não vivemos é, no mínimo, hipocrisia. Errei, minha consciência dói, a cabeça pesa no travesseiro, choro por minhas falhas e espero, um dia, ver-me livre da mácula que causei. Livre, se ela me perdoar, livre, se eu puder me perdoar.

Alberto da Cruz,
2007, 04 de novembro

domingo, 28 de outubro de 2007

Meu momento de desengano



Antes que termine o mês, minhas esfarrapadas desculpas. Minha cabeça atordoada é incapaz de formular uma idéia constante faz um bom tempo. Escrever se torna gradativamente uma atividade cada vez mais complexa. Não sei ao certo se a culpa, se é que há, é minha ou de algum fator externo e inerente a mim. O fato é que não consigo me concentrar para escrever. Começo textos que não termino, gosto e desgosto na mesma velocidade, apago minhas palavras como um homem frio que se desfaz de pedaços de si mesmo com a frivolidade cruel de um assassino vil. Perdi as contas do quantitativo inconcluso, só neste mês foram pelo menos quatro contos, uma meia dúzia de crônicas e uns tantos poemas inacabados como seres errantes, fetos abortados no sexto mês de gestação.
Escrever, às vezes, como dizia Pessoa, é maçada. Uma atividade evasiva frustrante, uma forma de enfrentar o estúpido mundo e se sentir vitorioso pelo menos uma vez na vida. O problema se dá no que escrever. Dizer das desgraças alheias, insanidades humanas, crimes ou corrupção, basta que se ligue a televisão ou se abra o jornal. Desgraças acontecem o tempo todo, não é preciso inventá-las. E se formos criar uma outra realidade paralela, ignorando a problemática constante da vida, caímos no risco de moldar um lugar de pessoas alienadas e distantes da crise mundial.
Outro fator que muito me incomoda é o que se propor a escrever quando já se foi dito quase tudo no campo literário. Como ser original em meio a tantas histórias já contadas. Dizer do cotidiano não é assim tão interessante a ponto de tomar a vida de um escritor de meia pataca que sofre mais o texto do que chega ao orgasmo com as palavras. Já disse que as minhas são prostitutas baratas que se vendem por muito pouco, agora, penso eu, elas se dão, se entregam, se jogam, uma vez que poucos por elas se interessam.
Gosto de criar personagens, dar a vida como se fosse um genitor, mas na atual conjuntura, minhas crianças são seres disformes, verdadeiras criaturas feias. Não ando muito feliz com minhas peças, não tenho chegado ao mínimo de verossimilhança em suas formações. Ao vê-los percebo um imenso buraco em personalidades fracas e vidas frágeis que são impulsionadas por motivos banais. Incabíveis formas de encarar os dias duros na vida e suas superficiais relações com os acontecimentos que os regem.
Estou a um ponto de me aposentar por invalidez. Encarar a triste verdade de que não sou um escritor, nem mesmo um daqueles ruins que encalham por aí. Minhas gavetas estão cheias de papéis gastos inutilmente. Várias vidas engavetadas, vários dias — e o dobro de noites —, perdidos no alimentar de um sonho que se finda. Dói aceitar que os alicerces ruíram, que os castelos eram feitos de areia e que o mar não se comove com a fragilidade das ilusões. “As ondas nervosas do mar” me devoraram tudo o que pensei ser com indiferença, sem se importar com minhas lágrimas, sem se incomodar com o sal do meu suor.
Se na prosa sou infeliz, busquei a felicidade nos versos, mas até mesmo eles me traíram. Foram mesmo eles ou minha incapacidade criativa o algoz da desgraça? Cansei de cantar o amor, não porque deixei de amar, mas por perceber que por mais que se componha sentimentalidades, elas não garantem a mesa do jantar. Mercenário? Não, não é a gana por dinheiro que me impele os versos, se dependesse disso já estaria morto de fome. Fama? Raros são os poetas que dela se fartaram em vida. “Poetei” para desabafar, para tirar de mim a angústia que me consome os dias, para desafogar a mágoa minha, para abstrair a realidades das minhas dores, para declarar o amor que a boca minha cala e o coração chora, para manifestar minhas vontades que escondo atrás das cortinas do espetáculo pobre que é minha existência. Escrevo para não morrer.
Pode parecer exagero, e sou exagerado, mas dadas as minhas debilidades físicas, talvez não consiga deixar uma parte minha sobre a Terra. É bem provável que não consiga gerar um filho, e isso me dói mais do que qualquer crise de minha doença. Sonho em poder carregar no colo um rebento saudável, em poder me orgulhar de uma criança esperta, em me emocionar ouvindo alguém me chamar de pai... mas o tempo passa célere e os meus dias estão cada vez menores. Minha incapacidade de ser progenitor me deixa verdadeiramente triste só de pensar na impossibilidade de não ter uma prole. Transfiro então esse desejo normal ao homem comum para meus textos, que eles se firmem como partes minhas que ficam após a morte e me façam ser lembrados de alguma forma positiva. Dizem que a imortalidade consiste em deixar ao mundo alguém que continue o seu trabalho, eu perco as esperanças de deixar alguém, assim meu legado foi dedicado aos versos, à prosa, mas elas me tem sido tão penosas que o meu pesar é o fracasso iminente. Eu choro.

Alberto da Cruz
2007, 28 de outubro

Publicado em:
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sábado, 6 de outubro de 2007

A volta do prazer esquecido



“Por isso escrevo em meio
Do que não está ao pé,
Livre do meu enleio,
Sério do que não é,
Sentir, sinta quem lê!"
Fernando Pessoa

Como eu havia previsto, esta semana foi muito corrida. Quase não fiz nada do que deveria ter feito, restringindo-me apenas a planejar ações futuras que, muito provavelmente, jamais ocorrerão. Estou em débito comigo mesmo, e isso me aborrece. Deixei de lado o Conto Conspiratório, assumo agora em público, não por achar que a história seja ruim, mas não tenho paciência no momento para pesquisar sociedades secretas, tampouco criar um clima de suspense. Não quero, nem vou, engavetá-lo como fiz com vários projetos meus. Apenas uma pausa nas atividades, para que eu possa limpar minha mente de assuntos conflitantes. Tenho urgência em resolver algumas pendências de minha vida pessoal, por isso, talvez seja a melhor explicação, não tenha conseguido dar cabo ao projeto firmado há exatamente um ano. Sei que quando livrar-me dos meus tormentos, a história fluirá como no começo e a trama se mostrará límpida como água de fonte — péssima comparação.
Mas nem tudo são espinhos, há também as rosas. Por falar nisso, minha primeira seleção de poemas foi intitulada “Espinhos e Rosas”, em 1996, com quinze anos de sofreguidão sobre a terra; selecionei cerca de cem poemas, todos ultra-românticos, e distribuí algumas cópias para os bons amigos. Mas voltando as benditas rosas, resolvi voltar a participar de concursos literários, depois de bons anos longe dessa loucura. Nem me lembro da última vez que enviei um texto para um concurso, tamanha a minha birra com bancas avaliadoras. De 2000 para cá, meu último contato com prêmios de literatura foi como jurado e membro de, isso mesmo, bancas avaliadoras, para meu próprio espanto.
Não sei se o que me levou a me expor dessa forma foi a vontade de competir com outros colegas em igual situação, se foi por não agüentar mais ouvir o editor dizer que publicar poesia hoje é complicado, ou ainda se a falta de dinheiro pesou em minha decisão, o fato é que, juntamente com Mariana, estou a selecionar o material que já possuo para montar um volume de aproximadamente 80 páginas para o concurso José Lins, de João Pessoa. Tenho material até de sobra, mas de qualidade discutível. Lembrei-me agora de uma história muito engraçada ocorrida com um poeta contemporâneo que enviou à editora algumas poesias e, na página final, pôs o seguinte recado: Não se preocupem, há mais lenha no forno. Passados alguns dias, recebeu a resposta do editor: Que bom para você. Quando tiver poemas, mande para nós.
Estamos ainda na metade do trabalho, nesta semana conseguimos escolher vinte poemas dentre cem. Falta muito ainda para lermos, avaliarmos e revisarmos. Certamente terei que fazer ainda algumas correções, pois tenho a péssima mania de escrevê-los e abandoná-los como um cafajeste que, depois de saciar suas necessidades, deixa a mulher entregue a sua própria sorte. Assim, terei que conquistar meus versos novamente para poder dar-me ao luxo de alterar algumas de suas imperfeitas construções.
Não satisfeito, também decidi participar do concurso literário promovido pela Fundação Escola de Serviço Público do Rio de Janeiro, FESP. Desse, terei o prazo para entrega um pouco maior, mas em contrapartida, a tarefa também. Concorrerei com três poemas inéditos e, três contos também inéditos. Quanto aos poemas não perco o sono, pois, como já mencionado, não me falta material, mas os contos, nenhum dos que tenho estão dentro das regras publicadas no edital. Ser limitado a um número de páginas é o mesmo que tolher a criatividade de uma criança. Portanto tenho que escrever novas histórias que correspondam ao exigido. Comecei dois deles recentemente, mas o que brinquei hoje já me agradou deveras. Só não sei se uma história erótica agradará a maldita banca. Pagar para ver é o que me resta.
Já que esse texto versa sobre voltas e reviravoltas, novamente me pus a poetar com prazer. Escrevo pelo menos um poema por dia e tenho me sentido satisfeito com o retorno textual. Claro que a inspiração vem de Mariana e nossa deleitosa relação. Depois de muito tempo penando os versos, finalmente as palavras fizeram as pazes e se relacionam tão bem que me causam espanto. Tem sido fácil escrever assim; e quando percebo, a estrofe está no cabo e o poema se revela como mágica. Aproveitando a fase criativa, projetei uma série de poemas intitulada “Ela”, em que separo do todo as partes que mais admiro na mulher — amada, obviamente. Discorro sobre elas, para depois, no fim, juntá-las e dar uniformidade aos fragmentos. Até o momento já tenho prontos: Teus seios; Teus pés e Teus cabelos. Resta-me agora compor os olhos, o nariz, os lábios, o ventre...
Apesar de voltar às boas com os textos, tenho pensado nos temas sobre os quais abordo. Sou poeta do amor, gosto de cantar às mulheres e carrego de sentimentalismo minhas composições, quando não, falo sobre o ato de escrever, metalinguagem e minhas limitações criativas, mas gostaria de mudar um pouco meu estilo, abordando questões existenciais e sociais. Eis minha pedra no caminho, no sapato, pois todas as vezes em que enveredei por essas estradas acabei por fazer péssimas construções. Devo tentar novamente, devo arriscar nos exercícios poéticos até que surja o que tanto almejo? Não me custa tentar, pois se não for feliz, apenas terei perdido alguns minutos em minha tediosa existência absurda. E para meu desprazer, isso eu faço constantemente.

Alberto da Cruz
2007, 05 de outubro.
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sexta-feira, 28 de setembro de 2007

Simples Gostos na Vida


“Eu não gosto do bom gosto
Eu não gosto de bom senso
Eu não gosto de bons modos
Não gosto”

Senhas, Adriana Calcanhoto

Eu gosto de acordar cedo e ver o mar pela janela do quarto. Eu gosto de beber café forte e muito quente, enquanto fumo um cigarro, logo que me levanto da cama, antes de fazer qualquer coisa.
Eu gosto de fazer sexo pela manhã, embora, à tarde, seja bom e, à noite, também. Gosto de experimentar, variar, inovar. Quase dispenso todos os tabus, menos homossexualismo, que não curto nem um pouco. Não tenho lugar, pode ser na cama, no sofá, no chão, sobre a mesa, debaixo da mesa, no banho, na cozinha, do lado de fora, dentro do carro... o que importa é a hora do prazer. Mas devo confessar que às vezes prefiro o depois ao durante, aquele momento gostoso em que os corpos extasiados se abraçam e, sentindo o calor do outro, adormecemos felizes num gesto enamorado. Sexo, para mim, é entrega total. Não curto um lance casual, tem de haver envolvimento afetivo sério, fazer com amor mesmo, pois sem, nada tem graça.
Gosto de música e das emoções que ela me propicia. Não tenho um estilo definido, ouço de tudo. Para mim, o que importa é o momento, por isso podem me pegar cantando de um samba-canção de Cartola a um grito visceral de Rock. Tudo depende do instante, mas tenho meus preferidos. Chico Buarque me faz pensar, amar e produzir, meu ídolo e exemplo tanto no cenário musical quanto no campo literário. A poesia de Humberto Gessinger me fascina como os poetas contemporâneos que admiro. Alcione me faz chorar, principalmente quando estou em crises amorosas. Ouvir Cazuza me dá um tremendo tesão, daqueles de deixar maluco mesmo; mas também me faz pensar na transitoriedade da vida e como o tempo é voraz. Se minha vida tivesse uma trilha sonora, ela seria de vários estilos, passeando dos clássicos compositores à musicalidade contemporânea.
Gosto de livros, minha paixão antiga. Cada volume adquirido é um orgasmo múltiplo. Vivo entre eles e de tanto estimá-los, tornei-me um bom leitor, mas poderia ser melhor. Nada me encanta mais do que uma boa leitura, seja de um romance, biografia ou poesia. A arte literária me toma os sentidos e me leva ao êxtase do supremo num gesto sublimado. Por vezes troquei diversos programas para me deleitar com um livro e, juro, jamais me arrependi de prostrar-me no sofá e viajar pela madrugada. Se ler é um orgasmo, escrever é a minha doce sina. Escrevo para me livrar tédio, para espantar a solidão, para sair da rotina, para desabafar minhas mágoas, ilusões e desespero. Ganho, bem menos do que gostaria, falando de minhas tristezas e de minhas insanidades, embora já faça um bom tempo que não vejo lucros sobre minhas divagações. Não paro com a escrita, mesmo descompromissada, é ela que me acalenta um pouco o espírito revolto.
Gosto de filmes, e passo horas diante da televisão, entretido com alguma trama fictícia. Não sou um cinéfilo assumido, mas tenho minhas películas prediletas. Meu gosto é variado. Adoro comédias do tipo besteirol. Amo filmes de terror, principalmente sobre vampiros, lobisomens e assombrações. Choro assistindo a um bom drama. Quero amar da forma como vi em algum romance. Sou louco por filmes de máfia e do período da Recessão Americana. Hoje em dia tenho prazer com as produções nacionais, diferentes das pornochanchadas antigas. Assisto a, mais ou menos, cinco filmes por semana, fora aqueles que eventualmente passam nos quatorze canais específicos que assino.
Gosto de carros. Sem restrições, qualquer tipo me atrai. Tenho predileção pelos antigos nacionais que a maioria dos antigomobilistas adoram, como: Maverick, Opala, Puma, GTB, Miúra e Galaxie Landau. Sou louco por esportivos importados, tive inclusive um Honda Civic que era o meu xodó, mas fui obrigado a vendê-lo. Gosto de me sentar ao volante e ouvir o barulho do motor ao virar a chave e levantar os giros. Dirigir é mais do que uma simples necessidade, é uma válvula de escape. Quando estou na estrada, faço questão de abaixar os vidros e deixar o vento bater em meu rosto. Gosto de ver a estrada pelo pára-brisa e saber que estou no controle. Amo velocidade, e às vezes exagero no acelerador, mas também curto uma volta bem devagar, observando o mundo passar a minha volta.
Gosto de plantas, de cultivá-las, de orná-las em pequenos vasos cheios de pedrinhas e musgos diversos. Quando estou com as mãos sujas de terra, delicadamente ajeitando as raízes, parece-me que esqueço as minhas próprias mazelas numa atividade catárticas. Tenho meus bonsai, a única forma de se ter árvores em uma casa sem espaço, e outras de diversos tipos. Perco horas debruçado sobre as pequenas plantas, podo, reparo, aramo, crio estilos, admiro, chego ao êxtase. Ainda encherei a casa de verde, mas tudo tem seu tempo certo.
Gosto de cozinhar, embora não possa comer quase nada do que levo ao fogo. Tenho prazer, pelo menos, em ver os amigos fartando-se com o que faço, e chego a experimentar alguns pratos apenas por vaidade, embora meu médico me repreenda por furar a dieta controlada de ingestão de açúcar, mal dos diabéticos. Aprendi a gostar de saladas e alimentos coloridos naturalmente, mas ainda enlouqueço com uma apetitosa massa.
Gosto de trabalhar, ainda que não receba o valor a que a classe educadora mereça. Realizo-me em sala de aula, quando me sinto responsável por, além de passar o conteúdo exigido pelas grades de ensino, ajudar a moldar um cidadão consciente. Meus alunos são meus amigos e os prezo da mesma forma a que os íntimos. Reclamo bastante, mas por nada largo meu ofício. Acredito na educação, mas não no sistema educacional atual. Espero uma reviravolta nos moldes em vigor, antes que as coisas saiam do controle.
Gosto da companhia dos amigos, por isso abro as portas de minha casa para todos eles, deixando-os tão à vontade como se estivessem em suas próprias. Compartilho do meu pão, da minha água, do meu uísque, do nacional é claro, o importado apenas a um seleto grupo dentro do círculo fraterno. Bons papos, conversas amenas, um programa íntimo em conjunto, tudo isso me satisfaz. Não preciso de agitação todas as noites para me satisfazer, na maioria das vezes sentar no sofá e assistir a um bom documentário, ou mesmo filme, bebendo e beliscando um aperitivo qualquer é muito mais prazeroso do que uma noite entre desconhecidos conhecidos.
Gosto ainda mais de ficar sozinho, embora precise de alguém muitas vezes. Faz parte de minha estranha figura trancafiar-me no escritório e refletir a vida. Já experimentei o convívio em sociedade de diferentes formas, mas preferi a solidão como amiga íntima. Sigo meus próprios horários e não mudo minha rotina por ninguém. Lavo a louça quando quero, arrumo a casa quando melhor me convém. Dito minhas próprias regras e não dou satisfação a ninguém por minhas escolhas. Sou independente, pago minhas contas, batalho pelo meu sustento, não preciso, pois me sujeitar aos caprichos de ninguém.
Gosto de adormecer nos braços da mulher amada, e ainda mais de acordar ao seu lado, mesmo que seja raríssimo, salvo em poucas oportunidades. Gosto de amá-la nesse ineditismo que esta relação representa a mim. Descobri que a felicidade existe graças ao brilho dos seus olhos, mesmo que eu bata no peito para defender meu direito de ser triste, uma vez que a tristeza é parte de mim. Momentos diáfanos ocorrem quando juntos o mundo pára, embora o tempo corra célere, sem respeitar as vontades do nosso pobre coração.
Gosto de pequenas coisas na vida. Eu valorizo detalhes que para a maioria são insignificantes. Tenho minhas loucuras e às vezes sou meio radical com minhas atitudes. Não sou perfeito como nenhum homem é, não sou especial, nem anormal; sou apenas diferente neste mundo de pessoas comuns.
Mas o que eu gosto mesmo é de fazer sexo pela manhã.

Alberto da Cruz
2007, 27 de setembro

Texto publicado em:
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quinta-feira, 20 de setembro de 2007

Mudança de comportamento entre o passado presente e o hoje

“Se tanto amor dentro de mim eu tenho
E, no entanto, eu continuo inquieto
É que eu preciso que o Deus venha
Antes que seja tarde demais”

Clarice Lispector
O que seria de minha vida hoje se as ações do passado recente tivessem sido outras? Essa é uma dúvida que me permeia o pensamento, mas não porque eu gostaria que fosse diferente, apenas uma estranha curiosidade sem muita importância. Muita coisa mudou na última rotação da Terra em torno do sol. Eu mudei bastante em relação ao que havia me tornado nos anos difíceis, mas se parar para pensar, afirmo que não mudei, e sim voltei a ser quem fui um dia e por variados fatores externos deixei de ser.
Os últimos dias foram bem interessantes, embora nada tenham me apresentado sobre a tecitura do romance, isso já virou rotina. Minha vida pessoal tem me tomado toda a atenção, mas não reclamo, nem a culpo por tal. Na verdade estava mesmo precisando refletir meus momentos e tormentos e esquecer um pouco o rumo profissional, já que passei bons anos investindo em minha profissão e meus anseios literários, deixando, por conseqüência, minha estima e acontecimentos íntimos de lado.
Imerso nesse clima “retrô-saudosista”, lembrei-me há pouco de certas passagens tolas minhas, tão tolas que me chegam a causar vermelhidão na face. Houve um tempo em que eu escrevia tão compulsivamente que nem mesmo os guardanapos de bar escapavam da minha caneta. Não havia um dia em que eu não escrevinhasse num papel qualquer que pairasse em minhas, hoje trêmulas, mãos. Foram tantos escritos que a maioria foi perdida entre um copo e outro de cerveja. Eram momentos pueris guiados por um forte ideal criativo que aos poucos diminui, tudo graças aos contratempos de uma vida desregrada e à beira de um fim triste, mas anunciado. Onde estão meus textos de bar? Onde estão meus delírios embriagados? Onde estão meus momentos de inconsciência alegre? Desaparecidos numa amnésia provocada em uma memória falha, eis a verdade.
Eu, sinceramente, não sei o porquê do afastamento de algo que me é tão prazeroso. Faz tempo que não me dedico aos meus prazeres maduros; faz tempo que não me tranco no escritório e escrevo ou reviso sem me importar com as horas em que, isolado do mundo, tenho apenas o microcomputador como companhia. E por falar nisso, nem mesmo uma boa leitura tem me feito permanecer sentado no sofá como antigamente era comum. Minha mente não pára. Uma avalanche de pensamentos me põe em risco e a única coisa que posso fazer é não fazer nada. Assim, atividades que me fascinam ficam de lado. Romances, poesias, filmes, nada me acalma o espírito revolto. Isso me entristece deveras.
Digamos que a vida breve mudou da água para o vinho na maior parte das circunstâncias que me rodeiam, mas em alguns pontos, o vinho tornou-se aguado sem que eu o diluísse. Coisa estranha, não? Dentre as mudanças, descobri que a felicidade existe. Eu, um tristão assumido desde os primórdios de minha curta existência, experimentei o gosto da alegria, e vi desenhar-se em meu rosto uma série de sorrisos plenos que jamais pude imaginar que fosse capaz. Depois de sair do inferno astral que me meti inconscientemente, parece-me que cheguei ao limiar entre amor e dor; ilusões sôfregas e realidades ternas... e tenho tensão de seguir para o lado positivo, pasmem.
Já não há mais como esconder, também não há necessidade para tal, finalmente me apaixonei como nunca antes, uma mistura de sobriedade e segurança, dando-me bases e esperanças de construir algo, enquanto ar ainda tenho para me encher os pulmões tão maltratados. Não digo que a reviravolta tenha sido impulsionada por sentimentalidades, até porque não seria uma reforma íntima que leva ao crescimento. Obviamente a contribuição tenha sua importância, mas as derrubadas que a vida me deu foram determinantes para uma revisão do comportamento geral. Processo evolutivo em que aprendemos com erros, ganhamos vivência e chagamos à conclusão de que a maturidade chegou. Só não quero que o amor de hoje se transmute em dor e mágoa um dia, realmente não quero, mas se acontecer, de cabeça erguida, será preciso continuar os passos em busca do desconhecido, com as lembranças dos meus melhores dias gravados na alma enamorada... mas não quero nem pensar que acabe, deixemos o futuro para o futuro, mesmo que não haja o futuro, deixemo-lo para depois.
Atualmente venho recuperando os dias de juventude que deixei passar, andando tão preocupado em solidificar um futuro que não foi o esperado. Se os pontos eu tivesse entregado quando as nebulosidades encobriram minhas vistas, já teria desistido, como sempre, e, talvez, tivesse adiantado o relógio à minha hora derradeira. Não estaria aqui escrevendo minhas histórias, bem provável que a última narrativa estivesse pronta antes do tempo, definitivamente.
Um ato realizado de forma impensada desencadeia uma multidão de aborrecimentos inevitáveis, mas um acerto, que mais se parece com um erro no princípio, na verdade é a correção das utopias e quimeras. Digo que hoje não me cabem as ilusões de antes; hoje o tempo me empregou marcas cruéis, portanto sou obrigado por mim mesmo a viver uma espécie de carpe diem pensado. Não afirmo que deixei de ser triste, mas a felicidade em mim existe e cresce, brota, floresce lentamente. Quem sabe ela perdure nos meus dias finais... E que eles demorem um bom tempo ainda para chegar.


Alberto da Cruz
2007, 20 de setembro

Texto publicado em:
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quarta-feira, 12 de setembro de 2007

Tenho medo de morrer amanhã

"Se eu morresse amanhã viria ao menos
fechar meus olhos minha triste irmã”
Álvares de Azevedo, Lembrança de Morrer


Odeio começar um texto que não terminarei no mesmo instante em que me comprometi a escrevê-lo. Odeio ser dominado por um maldito relógio. Odeio ser escravo do tempo e ter minhas vontades reprimidas pelo senso de responsabilidade profissional. Por que não podemos fazer o que quisermos de nossas vidas e estipularmos nossos horários independentemente das obrigações? Obrigações não deveriam ser obrigatórias, pois tolhem a criatividade, assassinam a inspiração e deixam tudo com um gosto meio amargo.
Por que então escrevo, já que sei que não chegarei ao fim do último parágrafo? Talvez por sentir uma necessidade monstruosa de expor meus pensamentos e compartilhar com muitos, com poucos ou somente comigo meus lampejos e idéias; talvez por apenas querer extravasar as loucuras que fervilham em minha mente mais insana do que normal... talvez apenas para fazer com que me sinta menos inútil nesta valsa doentia que é a vida. Vamos todos dançar.
Andei alguns dias longe da atividade redentora do meu espírito cansado e corpo doente. A vida passa rápido e o “tempo não pára” para que possamos esperar a tão desejada “hora da estrela”, principalmente no meu caso. Cada dia passado é um a menos no meu contador. Alguém me espera e eu sei quem é. Já vi a sua “cara” e não a achei assim tão linda.
Tenho medo de morrer amanhã. Tenho medo de escrever meu último texto; tenho medo de vê-la pela última vez... e partir desta esfera sem me despedir como desejo; tenho medo de não ver o sol nascer, de dormir e não acordar. Eu não quero morrer amanhã, embora não seja possível escolher. “Morrer não dói”, mas viver é um sofrimento inevitável que temos de enfrentar enquanto respiramos. Acho que é por isso que luto contra o sono e as horas silenciosas da madrugada. Preciso registrar meus pensamentos enquanto ainda tenho lucidez... mesmo que parca. Embora eu queira mudar o mundo, se não para muitos, pelo menos para aquelas pessoas que me cercam, contento-me somente com fazer a diferença na vida de alguém, ter uma razão, nesta passagem calamitosa, na vida. Poder fazer com que as pessoas se lembrem de mim por algo de bom que eu tenha feito. À noite, deitado em minha cama, temo ser esquecido... ou lembrado pelos meus erros, não pelos meus sucessos. Isso faz da vida um desespero, essa vontade de construir algo que perdure e transcenda a minha tediosa realidade. Eu preciso construir algo bom antes que minha luz se apague. Por isso tenho medo de morrer amanhã.
E se morrer tão logo nasça o dia, não terei dito adeus, nenhuma palavra de despedida àqueles que tanto estimo, nem mesmo um suspiro de consolação ao meu amargo fim. Dá-me agora vontade de pegar o telefone e ligar para meus pais; dizer que os amo acima de tudo; pedir desculpas pelas minhas desobediências na infância, pelos meus erros na adolescência e pelos meus ais de agora. Queria deixar bem claro que a culpa de eu ser assim não é deles, não é minha, e sim do acaso, do destino ou da má sorte que me ruiu os dias. Queria dizer ao meu jovem irmão que lamento não ser o seu exemplo, não estar presente nos momentos importantes de sua vida, que sua existência me fez lutar contra a praga mortal que me dilacera inteiramente. Gostaria de carregá-lo no colo como fazíamos quando eu tinha forças para lançá-lo às alturas e agarrar seu corpinho, sorrindo como ele, como uma criança feliz. Queria poder ligar a Ela e dizer-lhe o que encontrei a felicidade em seus braços, como sua voz infantil me acalentou nos momentos de mais intensa crise, como seu sorriso me forçava a resistir às plagas da dor. Infelizmente o adianto das horas inviabiliza a necessidade pungente de discar os meus dois números telefônicos tão queridos, por isso a dor da alma transcende a dor do corpo.
Pode ser que eu não morra amanhã, mas não ouso dizer-lhes o que grita em mim. Não quero assustá-los com minha incerteza, não quero que vejam em mim a “luz negra” apagar-me os sonhos. Causar tristeza nos que me amam enquanto ainda respiro seria um golpe ainda mais desumano ao meu pouco futuro. Prefiro vê-los sorrindo, prefiro fazê-los acreditar que estou bem e ando a arquitetar uma vida plena de objetivos. Pena que, para mim, sejam apenas continuar um pouco mais entre eles.
Dói-me olhar para trás, enquanto passa o meu curta-metragem, e lembrar que por vezes tentei contra minha existência; que pensei em desistir de tudo, vazar a cabeça com um tiro, lançar-me de um edifício, tomar dezenas de antidepressivos e agora, que mal me sustento, rezo em silêncio por um pouco mais. Mas me entregar à dura realidade do meu prazo também não seria uma forma de suicídio? Ou seria um modo louco de desistir da luta inútil, já que todos têm o mesmo fim? A consciência humana é mesmo problemática. Vivo em dicotomia, numa antítese crucial: viver para morrer “versus” não morrer para viver. Mas como um exclui o outro, embora rumem ao mesmo fim, sou prisioneiro desse paradoxo complexo da existência.
Estou fraco. Choro como um último bálsamo ao inevitável. Minha forma de encontrar alívio aos meus pecados é isolar-me em mim, trancafiar-me no pouco que me resta de paz. E mesmo assim até o que me tranqüiliza assusta. Estou em pedaços que jamais serão juntados, estou a um passo do desconhecido, a um passo de chegar aonde a luz brilha intensamente e não há mais volta.
Penso em como serei lembrado, se é que o serei. Minhas composições muito provavelmente serão enterradas comigo, algumas esquecidas em gavetas ou perdidas entre tantas folhas. E todo o esforço e dedicação aos quais me empenhei tão arduamente não terão valido nada. Todas as noites, debruçado sobre uma mesa calejando os dedos com a caneta, terão sido inúteis como fora a minha vida. Logo eu que tive o sonho de um dia ser alguém, de ser reconhecido por uma utopia. Se eu tivesse tempo para amadurecer minha literatura medíocre, talvez eu fosse lembrado, sem honras, mas lembrado e, quem sabe, homenageado de alguma forma num evento menor. Mas não!
O amanhã está próximo, e eu não quero morrer sem dizer perdão e adeus. Realmente não quero... mas não depende de mim, infelizmente não.

Alberto da Cruz
2007, 11 de setembro

Já lustrei meus sapatos

A tarde é fria. Eu já não sei que graça tem a vida. Meu coração, de luto, palpita. Certas coisas trazem à luz um sentimento obscuro de partida; a minha partida. Esvaindo-se lentamente, a essência vital da juventude me abandona a cada dia. Não tenho mais prazeres, não me restaram dos sonhos a esperança. Tudo morre um dia, nada é eterno, tampouco tem pretensões de ser. È inevitável lutar contra o único fato derradeiro, quando não se há mais soldados nem guerreiros.
Eu deixo a vida, não hoje, mas ao poucos. Lutar? Por que haveria de cansar-me com uma batalha que antes mesmo de iniciar-se já está perdida? A morte me rodeia, me enlaça, abraça, me beija. Acaricia-me a testa, desce à minha nuca, segura-me nos ombros. Consolo último nos dias de sofrimento elevado. Não tenho medo, mas a ponta da melancolia me faz chorar. E essas lágrimas em silêncio e segredo que me escorrem pelo rosto amargurado aliviam a dor do desengano.
Se eu tivesse um revólver não pensaria duas vezes, poria em prática o gesto malfadado, exteriorizando meu sangue doente em troca de um pedaço de chumbo. Mas não posso adiantar o futuro. Falta-me coragem. Apesar disso, é inevitável dizer que a sorte me abandonou. A morte é uma donzela à espera da valsa. Já lustrei meus sapatos. Aguardo a orquestra.


2007, 07 de setembro

domingo, 2 de setembro de 2007

Salve a estupidez humana

Estou cada vez mais relapso com as postagens e ainda mais displicente com os textos. Culpa da vida atribulada que não me deixa espaço para nada mais do que as inúmeras atividades profissionais? Não, definitivamente não! O culpado sou eu mesmo e minha incondicional preguiça melancólica. Passei esta semana, digamos, na flauta; trabalhei pouco devido a uma série de fatores inerentes a mim, mas não reclamo, apesar de que na semana passada o labor foi muito mais brando, já que fui acometido por uma estranha virose que me derrubou por quatro enfastiados dias. Embora o tempo que tanto almejei tenha surgido, não consegui concentração para realizar nada do que me objetivei a fazer. Vi alguns filmes, li poucas páginas de Risíveis Amores e só. Fui incapaz de pôr em prática o meu segundo ofício e agora peno as plagas da insatisfação própria. Nova semana começando e, para piorar, é chegado o momento de planejar testes e provas para o fechamento do bimestre. E lá se vai meu tempo.
Novamente o Conto Conspiratório ficou de lado e já acumula teias de aranha. Parece brincadeira, não é falta de compromisso ou seriedade com a história; realmente esse projeto me enche os olhos, mas estou atravessando uma fase tão difícil que me é penoso abraçar essa empreitada e dar cabo da história. Uma novela mexicana, é assim que eu me refiro a ele. Para piorar, já faz algumas semanas que não converso com Jean e a distância que nos encontramos só tende a piorar as coisas. Preciso agora me empenhar ou perderei uma nova oportunidade. Fui convidado a participar de um bom concurso literário, cuja premiação é tão boa quanto o outro, e ainda não rabisquei nenhuma linha. Até poucas horas não sabia sequer sobre o que poderia escrever, mas graças a uma incômoda dor de dente, tive a idéia para tecer uma historinha de suspense para enviar à editora. Resta-me agora amadurecer a idéia, criar as personagens principais, definir tipo de narrador, tempo e espaço para enfim começar a labuta. Para a mesma editora, enviarei também dois poemas com o mesmo intuito, concurso. A dúvida é se devo quebrar a cabeça escolhendo-os dentre os que já foram compostos ou se escrevo dois inéditos e exclusivos para a participação neste concurso. Ruim por um lado, tenho ojeriza a concursos desde que me aborreci com as falcatruas dos últimos que participeis; bom por outro, pois só assim posso ter a medida certa do meu amadurecimento depois de ter renovado o contrato editorial e simplesmente ter me limitado a dois pequenos volumes de poesias, alguns contos e esparsas crônicas sem muito valor. Quero ver como me saio depois de tanto tempo sem me expor ao crivo da crítica especializada.
Não posso só dizer as coisas ruins destas últimas semanas. Mais idéias surgem e não dou cabo delas. Acredito que eu deva trabalhar com idéias, pois as tenho uma atrás da outra numa propulsão maior do que minhas pseudo-habilidades. Deveria anunciá-las em classificados de jornais e vendê-las a preço de custo: Vendem-se idéias de todos os tipos. Preço de ocasião, pois elas me surgem, se desenham e se vão sem dizer adeus, porque eu não sei aproveitá-las. Isso me irrita. A última me apareceu lacerante depois de um dia dificílimo em que pensei tenazmente em pôr fim à sofreguidão dos meus dias. Mal como de costume, rotina esdrúxula, ouvia Cazuza e tive vontade de assistir a O Tempo não pára, com Daniel de Oliveira dando um espetáculo de interpretação. Terminado o filme, voltei a ouvir o poeta miserável levado muito cedo para a eternidade. Acho que pela primeira vez fui além do óbvio na poesia de Cazuza. Descobri nele um lirismo marginal, embriagado e decadente. Resolvi que escreveria um ensaio sobre sua obra, depois, já com a preguiça, um artigo. Como estou sem paciência, decidi por apenas um “textinho” sem muito aprofundamento sobre este ícone da música dos anos 80, que assim que estiver esboçado vai encher a caixa de e-mail dos amigos. Começo com uma nota apenas e algumas letras, depois, dependendo da aceitação, envio um texto decente a altura da grandeza do poeta. Torçamos para que eu não desista no meio do caminho e pare com o proposto... como já me é de praxe.

segunda-feira, 27 de agosto de 2007

Uma semana daquelas



Felizmente a semana acabou. Entramos agora nos últimos dias de agosto, o mês do desgosto. Chega a ser hilário, pois eu nunca acreditei muito em certas crendices como essa, mas as tempestades do oitavo mês do ano me comprovaram o quanto as previsões estavam corretas. Logo nos primeiros dias já imaginei que seria um período difícil, pelo lado financeiro principalmente, porque passei dos limites bancários no recesso com uma imensidade de gastos não previstos e ainda um verdadeiro prejuízo com o civic, o que de fato me levou a vendê-lo, apesar de, no fundo, não querer me desfazer do sonho automobilístico da juventude. Fi-lo por não querer mais ter as dores de cabeça constante, nem ser motivo de alegrias para o mecânico. O que gastei com o bendito em um ano poderia facilmente quitar as prestações que faltavam no banco. Mas não adianta ficar lastimando o desfecho da novela. Ele se foi e espero que ainda sobreviva por mais alguns anos, pois guardo ótimas recordações dele, apesar dos contratempos e certas decepções que o potente carrinho me fez ter... mas algumas lembranças ficaram impressas na memória e jamais se apagarão, disso tenho certeza. Além disso, os débitos constantes e a dívida com os cartões chegando a níveis exorbitantes fizeram com que eu segurasse um pouco os gastos e ter mais controle sobre meus impulsos capitalistas. Agosto tem sido um mês complicado, mas, próximo do fim, espero respirar aliviado nos próximos dias.
Com todos esses entraves, tornou-se praticamente impossível dedicar-me a qualquer outra atividade. A cabeça pesa diariamente uma tonelada e me faz prostrar sem conseguir ler, estudar, escrever e trabalhar bem. Minha saúde também afetou, além do corpo fatigado, meu pensamento. Acabei por me enfraquecer e cai de cama nesta infeliz semana. Quase não trabalhei, e quando o fiz, fiz mal, muito mal.
No lado afetivo, as coisas também não acorreram bem ao meu favor. Embora alguns momentos tenham sido pinturas perfeitas, ou excelentes poesias, brigas por pequenos e insignificantes detalhes acabaram por minar o que poderia ter sido, e não foi, um perfeito fim de semana. Não é novidade dizer que eu e ela brigamos novamente, basta que saíamos um dia para que nossa noite termine em uma discussão cansativa às quatro da manhã. Dessa vez, ao meu contentar, não estava com o carro, novo e muito zelado ainda, portanto exagerei nos copos que levei a boca na sexta-feira e terminei, depois de muitas palavras duras, com a cara enfiada no vaso do banheiro de Mariana, pondo para fora tudo o que ingeri no dia. Passando muito mal, não pude voltar para casa e terminei por dormir fora. Fazia tempo que não tinha uma boa noite de sono, lado positivo, pois acordei revigorado... Precisava disso, afinal a sexta foi uma sucessão de momentos cansativos: dentista pela manhã, lavar dois carros à tarde, voltar a trabalhar no último dia produtivo da semana, no turno da noite ao meu pesar... e para finalizar uma tentativa frustrada de diversão no Caiçara, ao som de violão e cerveja. Não havia como terminar bem.
Problemas resolvidos, tudo transcorria bem até toparmos com outro mal-estar: Paraty, Festa da Pinga, Zeca Baleiro, eu sem dinheiro, Mariana irritada. A soma de todos esses fatores nos levou a outra briga, mais uma para nossa coleção.
Há quem se espante com tantos desentendimentos, mas mais do que eles, há as reconciliações e os momentos plenos de harmonia entre nós, e esses são impagáveis, indizíveis, indescritíveis, incríveis. Portanto mesmo que ainda estivéssemos chateados um com o outro, acabamos por vir aqui para casa e, no marasmo que essa casa é, principalmente num sábado à noite, resolvemos assistir a Psicose II(faltam ainda as duas últimas continuações agora) e melhoramos um pouco o astral, embora houvesse ficado um clima tenso entre nós, causado por vontades e limitações diferentes. Hoje nos vimos somente há pouco, mas, aos meus olhos, tudo caminha para uma reconciliação plena, afinal passamos poucos, mas bons momentos juntos.
Outra nota ruim é que, como não consegui nenhum texto de “Tragédias Cariocas”, de Nelson Rodrigues, não pude escrever a crônica pedida pela Nova Fronteira, em conseqüência não fiz o curso, tampouco participei do concurso literário, cuja premiação fizera meus olhos brilharem. Felizmente, uma nova oportunidade me surgiu e, dessa vez, vou esforçar-me ao máximo para cumprir o prazo estipulado para a entrega do material: dois contos e dois poemas. Acredito que chegarei à conclusão desse projeto em tempo hábil, mas tenho a impressão de que não conseguirei alcançar meus objetivos, embora, obviamente seja a minha vontade e salvação financeira.
Vejamos aonde o barco me levará. Espero que seja para um porto muito seguro, ou temerei o naufrágio de minha nau neste mar inescrupuloso editorial.

Alberto da Cruz
2007, 26 de agosto